O dízimo no Novo Testamento

Na rubrica DÍZIMO, a minha Chave Bíblica indica umas poucas referências no Novo Testamento. Seis vezes a palavra aparece em Hebreus 7, mas aí não se está tratando diretamente do dízimo, ou seja, não são dadas instruções específicas de como dizimar, ou o que deve ser dizimado, ou quando dizimar, nem onde entregar o dízimo etc. Isso é feito detalhadamente no Velho Testamento, como já vimos. Em Hebreus 7, a discussão gira em torno da superioridade do sacerdócio do Senhor Jesus Cristo em relação ao sacerdócio levítico, sendo a entrega do dízimo tomada apenas como exemplo. Tanto que os dizimistas não são propriamente mencionados; menciona-se a tribo de Levi, que entregava aos sacerdotes os dízimos dos dízimos recebidos. Vamos, pois, aos evangelhos: Mateus 23 e Lucas 11 e 18. Mateus 23 e Lucas 11 tratam do mesmo assunto. Os pregadores do dízimo gostam muito desses dois textos, porque neles o Senhor Jesus diz: devíeis fazer estas coisas (praticar a justiça, a misericórdia e a fé), sem omitir aquelas (dar o dízimo da hortelã, do endro e do cominho). Tá vendo? — diz o doutrinador — Jesus está mandando você dar o dízimo! Em Lucas 18, o Senhor Jesus conta a parábola do fariseu e do publicano. A palavra dízimo aparece apenas na oração do fariseu presunçoso, ou, se preferir, do dizimista presunçoso, onde ele diz que jejuava duas vezes por semana e dava o dízimo de tudo quanto ganhava, e, por isso, se achava melhor do que todos, especialmente, melhor do que o publicano. Se alguém acredita que esse exemplo do fariseu deve ser seguido, não esqueça de incluir no cardápio a primeira parte dele: jejuar duas vezes por semana!

Notamos que nas poucas vezes que o Senhor Jesus se referiu ao dízimo, ele o colocou em posição secundária e sem maior interesse. E com respeito ao dinheiro, teve até o cuidado de advertir: Ninguém pode servir a dois senhores, porque ou há de aborrecer-se de um e amar ao outro; ou se devotará a um e desprezará ao outro. Não podeis servir a Deus e às riquezas [Lucas 16]. Dentro dessa sua concepção, orientou um homem rico, dizendo-lhe que se desejasse ser perfeito deveria se libertar da escravidão das riquezas: Vai, vende os teus bens, dá aos pobres, e terás um tesouro no céu; depois vem, e segue-me [Mateus 19]. Hoje, esse conselho é dado de uma forma diferente pelos pregadores: Vai, vende o que tens e me dá o dinheiro...!

Em cima de uma minguta frase de três palavrinhas: sem omitir aquelas (dar o dízimo da hortelã, do endro e do cominho), os cobradores do dízimo criaram uma doutrina absurda: Se você não pagar o dízimo, não pode ser membro da igreja! Foi assim que disseram ao Zé da Estrada. Esse é o apelido do homem que vi no acostamento da rodovia, com um monte de peneiras e balaios, esperando uma carona. Dei-lhe a carona. Conversa vai, conversa vem, descobrimos que comungávamos a mesma fé. Mas o Zé da Estrada estava muito triste e frustrado. Ele queria fazer parte daquela igreja, mas o pastor não deixou, porque ele não era dizimista. E ele não sabia como fazer, pois o dinheiro arrecadado com a venda das peneiras e dos balaios, que ele e a esposa faziam ali mesmo à beira da estrada, era curto e mal estava dando para o sustento da família. Talvez eu tenha sido de alguma forma um conforto para ele, pois naqueles dias eu estava fazendo a releitura da Bíblia, e repassei-lhe algumas coisas que eu já havia aprendido sobre o dízimo.

O outro teve alguns problemas com a esposa e afastou-se da igreja. Era dizimista de vultosas quantias. Peregrinou por outras comunidades e, depois de alguns meses, retornou à sua igreja. Mas aí, ficou diante de um problema insolúvel: o pastor somente o aceitaria de volta se ele pagasse os dízimos atrasados, correspondentes aos meses em que estivera ausente da igreja! Ele desistiu.

Precisamos aprender de uma vez por todas, que o que apraz a Deus são os atos de justiça e não necessariamente a prática de cerimônias e sacrifícios. Foi isso que ele revelou ao seu povo, por intermédio do profeta Oséias: Pois misericórdia quero, e não sacrifício; e o conhecimento de Deus, mais do que holocaustos [Oséias 6]. E que o próprio Senhor Jesus endossou em pelo menos duas ocasiões: Ide, porém, e aprendei o que significa: Misericórdia quero, e não holocaustos; pois não vim chamar justos, e, sim, pecadores [Mateus 9]. Mas se vós soubésseis o que significa: Misericórdia quero, e não sacrifícios, não teríeis condenado a inocentes [Mateus 12].

Isso é o que deve falar mais alto em nossas vidas, em nosso testemunho. À prática desses atos, o Senhor Jesus deu verdadeiro valor; e exigiu que assim fizessem os seus discípulos.